#28: Uma maratona de 5 anos
Em 5 anos tive perdas duras, mas tive ganhos também. Hoje tenho muito mais Nós.
Um casamento.
Uma pandemia.
Uma demissão.
Uma tragédia climática sem precedentes.
Uma empresa em apuros.
Uma redescoberta de carreira.
Um diagnóstico de ansiedade.
Três gestações.
Uma filha quase nascendo.
O primeiro e o último item desta lista estão em ordem.
Os outros, não exatamente.
Eu ando muito reflexiva, já há alguns meses, com a comparação dos anos de 2019 e 2024, e tudo que aconteceu no meio deles.
Casei no dia 14/09/2019. Há 5 anos.









Bodas de madeira ou de ferro.
Segundo o primeiro resultado do Google, "os 5 anos de casamento são chamados de bodas de madeira ou ferro, e simbolizam a força e a resistência do casal. A madeira e o ferro são materiais escolhidos para representar a relação, que já passou por adversidades e se tornou mais sólida e resistente".
Pode ser apenas um resultado genérico do Google, mas inegavelmente ele diz muito sobre nós.
O dia do meu casamento foi o dia mais especial da minha vida até agora - mas suspeito que em breve será substituído pelo dia do nascimento de uma certa pessoinha que vem se anunciando.
Nesse dia, eu terminei meus votos dizendo "Pode vir mundo. A gente tá preparado".
Estávamos de fato?
Não sei. Mas era assim que eu me sentia, tendo a mão do meu marido pra segurar.
Fato é que esses últimos 5 anos foram uma grande maratona. Com obstáculos. Vários.
Surpresas. Dificuldades internas e externas. Ansiedades. Dúvidas.
E resiliência. E força. E amor. Só assim conseguimos seguir correndo (ou por vezes, caminhando), nessa maratona. E agora, finalmente, a linha de chegada dela tá logo ali.
E às vezes eu ainda não acredito que esteja.
Engravidamos pela primeira vez em agosto de 2022. Naquele ano, eu passei nosso aniversário de 3 anos de casamento grávida - e fiz esse post aqui, em que eu falava que "eu mal podia esperar pelo que vinha pela frente", que era uma referência ao nosso primeiro bebê, que ainda não tinha sido oficialmente anunciado.
Soubemos que aquele coraçãozinho não batia mais em seguida, dia 23/09/22. A primeira das maiores dores da minha vida. O primeiro grande trauma. A primeira vez que eu encarei um momento tudo ou nada - aqueles decisivos, em que uma frase muda tudo: "infelizmente não há mais batimentos". Um momento que podia ser tudo, se a frase fosse "seu bebê está aqui, e cresceu como esperado na última semana". Mas quis a vida que esse fosse um momento que virou nada.
No intervalo desses 5 anos, superamos uma pandemia, que acarretou uma demissão pra mim, muitas dificuldades para a empresa do Thiago. Tivemos que nos reinventar profissionalmente. Seguramos um na mão do outro e buscamos por isso.
Em 2023, mais uma perda gestacional. Mais um momento tudo ou nada que virou nada. Mais uma vez escutamos aquela temida frase. Mais trauma.
Passei por 2 cirurgias para fazer com que meu corpo se tornasse mais receptivo a gestar, uma bem complexa, de retirada de mioma, que exigiu muito de mim física e emocionalmente.
Logo após, início de crises de pânico e um diagnóstico oficial de ansiedade, seguidos do início de um necessário acompanhamento psiquiátrico.
Ainda assim, eu me agarrava na fé e sempre tentava afastar os pensamentos de dúvida, que me faziam questionar se eu seria capaz de gestar o nosso bebê e realizar o sonho de aumentar nossa família. Eu sempre quis acreditar que o sonho seria realizado, que ele estava só sendo adiado.
2024 começou promissor. No finzinho de janeiro, descobrimos a nossa terceira gestação, que veio, mais uma vez, rápido, no primeiro mês de tentativas. Vencemos um primeiro trimestre cheios de medo de que o sonho pudesse ser mais uma vez interrompido. O dia do exame morfológico de primeiro tri, que confirmou que a nossa filha, Felipa, era perfeita e estava bem formadinha, foi uma grande vitória. O prognóstico agora estava a nosso favor.
Logo após, no segundo trimestre, veio a enchente que assolou o Rio Grande do Sul e que paralisou as vidas e a economia gaúcha por alguns meses, e que segue, naturalmente, impactando-as até agora. Com isso, as ansiedades internas se refletiam internamente, e o segundo trimestre não foi aquela "lua de mel da gestação", como muitos falam. Mas vencemos ele também.
Chegamos ao último trimestre em julho.
A partir daí, um monte de coisa boa se apresentou:
Nosso chá de bebê, um momento tão sonhado, em que reunimos as pessoas que mais torciam pela nossa família e que acompanharam todo nosso processo.. No discurso do chá, o Thiago trouxe algo que também temos pensado muito: essa gestação da Felipa não é de 9 ou 10 meses, mas sim de 2 anos, desde que essa montanha russa da maternidade / paternidade começou.



O quartinho da Felipa ficando pronto, projetado com todo amor e carinho pela vovó e pela dinda arquitetas, da Arqsoft, com tema de arco-íris e tudo que a mamãe sonhava, em um espaço pequeno, mas cheio de detalhes especiais;



Fotos gestante, em que decidimos retornar para o Estalagem La Hacienda, em Gramado, local que casamos e que fizemos nossas fotos pre-wedding também. Contamos com o olhar da mesma fotógrafa, a Aline Evelin. E ali foi impossível não pensar na diferença de vida e de momentos de 2019 e 2024.






Muita coisa que era sonho se tornou real no fimzinho desse período de 5 anos.
Comecei cada vez mais a perceber e refletir sobre tudo que aconteceu nesse período.
Eu acho que a pandemia teve um impacto global e individual que ainda nem conseguimos dimensionar, como sociedade. Tivemos uma luta coletiva com milhares de perdas - e na minha família ainda tivemos a sorte e o privilégio de não termos tido perdas humanas decorrentes dela. Ainda assim, nossas vidas foram fortemente mudadas e abaladas.
Após o fim dela, no universo particular que compartilho com meu marido, encaramos a nossa maior luta individual. A luta por um bebê, que envolveu dois lutos.
Com isso tudo, endureci.
Pouco chorei nessa gestação. Eu, que sempre chorei fácil.
Mas na última terça-feira, em consulta com a minha psiquiatra, Dra Simone, eu me dobrei.
Era nossa última consulta antes da chegada da Felipa. Ela, cuidadosa e atenciosa como sempre, solicitou que o Thiago, meu marido, estivesse presente naquela consulta. Ela queria falar principalmente sobre puerpério e sobre os possíveis impactos que ele poderia ter em mim, e quais sinais o Thiago poderia estar atento e identificar, para assim poder ajudar e acioná-la, se necessário.
Falamos também bastante sobre o cansaço e a ansiedade dessa reta final.
Como ela colocou, é como se estivéssemos escalando uma montanha, estivéssemos quase chegando no topo, já conseguíssemos até o enxergar, mas para chegar lá ainda precisávamos de uma quantidade grande de força e energia, em um momento que já não temos mais muito.. É bem assim que me sinto. Tão longe, tão perto.
Ainda sinto medo de não chegar nesse topo. Administro esse medo todos os dias.
Ao mesmo tempo, eu estou bem cansada. Fisica, com uma bebezona que já tem 3,2kg e 48cm e me faz ter um barrigão, e emocionalmente, pois sustentar essa terceira gestação, com tanta complexidade e com o nosso histórico, tem me demandado muita força psíquica.
No final da consulta, a Dra Simone começou a falar sobre como tinha sido especial acompanhar a minha gestação, e como ela estava emocionada de estarmos chegando ao final. Ela começou a chorar. O Thiago começou a chorar. Eu comecei a chorar. Nos despedimos.
E eu segui chorando por mais uns 30 minutos. rsrsrs. No fim, nem estava muito claro o porquê daquele choro, mas percebi que ele precisava acontecer. Eu precisava colocar pra fora.
Esses últimos 5 anos tiveram muita coisa triste, difícil, desafiadora. Mas tiveram muito amor e muita parceria para que a gente passasse por tudo isso. Entre nós e com as pessoas ao nosso redor. Com os laços que temos.
E agora esse período está acabando e inaugurando uma nova fase, em que teremos nosso maior presente conosco.
O maior presente do nosso casamento, do nosso amor.
Ao mesmo tempo, eu quero sempre honrar o que e quem veio antes. Por mais difícil que tenham sido esses anos, especialmente as nossas perdas gestacionais, foram anos importantes que nos ensinaram muito e que hoje nos fazem pessoas melhores. Falei um pouco disso nesse post recente aqui. Tudo que passamos nos uniu ainda mais. E nossos bebês, todos eles, sempre terão o seu lugar na nossa família.
E claro, vale dizer, reconhecer e não esquecer: no meio das lutas, tivemos vários momentos de alívio, de diversão, de realização, de felicidade, em que encontramos alguns oásis no deserto:
Conhecemos um amor incondicional novo, a partir do nascimento do nosso sobrinho e afilhado, Inácio, em 2021, que tanto nos ensinou sobre a infância, sobre cuidado, sobre prioridades e que se tornou um grande companheiro dos dindos. Depois, neste ano, fomos abençoados com mais dois afilhados, Miguel e Fernando, que, tenho certeza, serão grandes amigos e companheiros da Pipa;
Fizemos algumas viagens bem legais e inspiradoras, como nossa lua de mel para Austrália e Nova Zelândia, ainda em 2019, uma viagem em família para o México em 2022, outra para Estados Unidos e Canadá ano passado, além de várias escapadas mais curtas para Airbnbs aqui no RS, principalmente durante a pandemia;
Eu tive várias conquistas profissionais importantes, me tornei CMO, liderei equipes incríveis e conheci pessoas no âmbito profissional que me fizeram crescer e evoluir muito. Muitas dessas pessoas seguem comigo, no meu dia a dia, até hoje, tanto a nível profissional como pessoal - vários viraram amigos e são grandes presentes;
A empresa do Thiago sobreviveu à pandemia e fechou contratos novos que mudaram o seu patamar. Recentemente, na última segunda-feira, ele fez pela primeira vez um evento de comemoração aos 17 anos da empresa. Foi super emocionante e recompensador;
Tivemos uma série de casamentos de grandes amigos, alguns perto de casa, outros em lugares incríveis como Rio de Janeiro, Trancoso, Praia do Rosa, que nos fizeram viver momentos de grande alegria e agradecer por termos tanta gente legal ao nosso redor.
Em 14/09/2019, eu jamais imaginaria o que viria pela frente. O que veio foi surrealmente difícil - ainda bem que, com momentos de alívio no meio. Eu não sabia que seria uma maratona, mas foi uma maratona que se apresentou. Eu não sei o que vai acontecer nos próximos 5 anos. Mas o que eu sei é que estou mais preparada para qualquer desafio que vier daqui para frente.
No dia 14/09/2029, quero voltar nesse texto, se Deus quiser com mais leveza, comemorando os 5 anos da Felipa, os 10 anos de casados, meus 40 anos, e uma vida com muita saúde e cada vez mais realizada e cercada de gente especial. Com surpresas boas que eu nem consigo projetar aqui, ainda, ou controlar. Que essas surpresas boas predominem e que a necessidade de controle fique, cada vez mais, no passado.
Pensar a vida em períodos e fases mais longas tem feito sentido pra mim.
Eu mudei muito em 5 anos. Minha carreira mudou completamente. A maneira de encarar a vida também. As prioridades nem se fala. Mas sigo rodeada de pessoas especiais. Meu marido principalmente, mas mais um monte de gente incrível que faz minhas maratonas um pouco menos difíceis.
Em 5 anos tive perdas duras, mas tive ganhos também.
Hoje tenho muito mais Nós.
Agora sou mãe.
E sei que isso muda tudo.
Que venham os próximos 5 anos, cheios de Nós. E de laços.
Mundo, pode vir. Acho que a gente segue preparado, mas se puder, alivia aí nas maratonas, vai 🙂.
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Wow!!! Que texto lindo!
Amiga .. és uma verdadeira guerreira ❤️ É lindo te acompanhar e sempre ficamos aqui torcendo por vocês!! Estaremos junto apoiando na chegada nesse topo que certamente será lindo e cheio de descobertas novas. 😁