#16: Saindo do modo controle e entrando no modo entrega
Às vezes a gente tem a sensação de estar no caminho errado e se sente perdido entre passado, presente e futuro. Esquece que o caminho para um futuro ideal é uma sucessão de presentes ideais.
Lancei esse canal aqui em maio do ano passado, no dia das mães. Foram 15 textos desde então. Só que, segundo o meu planejamento, seriam 17 e eu teria lançado dois textos a mais em 2023, incluindo um texto de fechamento do ano.
Quis o destino me mostrar mais uma vez que ele não está nem aí para o meu planejamento. Entre novembro e dezembro fiquei 1 mês sem conseguir escrever publicamente, devido às crises de pânico que me paralisaram. Lancei o texto 15 falando disso (se não leu, leia aqui), e planejava um último para a última semana de dezembro e do ano, fazendo um fechamento e balanço geral. E, claro, agradecendo a todos vocês que estiveram por aqui comigo nesse ano.
Só que eu simplesmente não tive energia para fazer esse texto. Eu estava exausta.
2023 foi um ano que me atropelou, tanto que acabou com episódios de ataques de pânico nos últimos meses dele. E para piorar, eu fui mais uma que entrei naquela doidera da "dezembrite", com mil compromissos e uma agenda cheia de coisas pra resolver em cada turno disponível (me ajudem a lembrar por que a gente faz isso com a gente, mesmo?). Na última semana antes do Natal foram 22 compromissos, além do trabalho oficial todas as manhãs. Fiquei (ainda mais) esgotada, por isso tudo e pelo acúmulo dos meus lutos e lutas do ano.
Então, aceitei esse esgotamento e a falta de cumprimento do meu planejamento - e isso para mim que sempre quero cumprir e controlar tudo já é um grande progresso. E aí pela primeira vez desde que eu comecei a trabalhar em empresas de tecnologia, em 2016, eu decidi tirar férias no período do limbo entre Natal e Ano Novo. Foi ótimo. Consegui descansar. Não o suficiente, mas descansei. Não tive mais nenhuma crise. Que alívio.
Mesmo não tendo parado para escrever por aqui, eu refleti bastante e escrevi minhas páginas matinais do Caminho do Artista. Finais de ano normalmente nos convidam a pensar o que fizemos de legal no ano, o que queremos melhorar para o próximo. A fazermos as famosas resoluções que muitas vezes são criadas em dezembro e abandonadas até o final de janeiro rsrsrs.
Eu aceitei o convite do momento para pensar. Refleti muito. Mas controlei menos. E não, não fiz resoluções de ano novo ou grandes metas.
Eu tenho me encontrado muito reflexiva, até mais introspectiva do que o meu normal, às vezes até me estranho. Ando pensando muito sobre a minha vida, sobre meus desejos e meus processos. Sobre o tempo. O tempo talvez seja a maior reflexão desses últimos meses, e fonte de estudo em livros, podcasts e muitas sessões de análise. Tenho pensado muito também sobre a minha grande necessidade de controle - inclusive, após o meu último texto, uma leitora querida me sugeriu trabalhar mais esse tema na minha análise. Aceitei a provocação.
Eu engravidei pela primeira vez em agosto de 2022, no primeiro mês de tentativas. Já falei algumas vezes que sempre imaginei que eu demoraria para engravidar devido ao acúmulo de anos de uma vida estressante e pouco saudável. E não foi o que aconteceu - eu tenho conseguido engravidar fácil, só não estou conseguindo manter. As dificuldades que eu tinha imaginado nesse processo de gravidez são muito diferentes das reais. E ta aí mais um aprendizado de como não adianta a gente controlar tudo ou se preocupar antes da hora. A gente só conhece de fato a realidade quando ela chega.
Se aquela primeira gravidez tivesse evoluído, meu bebê teria nascido em maio de 2023 e já teria 8 meses agora. Nada fluiu dessa forma, já tive mais uma perda desde então. Mais um bebê já poderia ter nascido, em dezembro de 2023.
Eu estou aqui, em janeiro de 2024, 16 meses depois da descoberta da primeira gravidez, não grávida e sem bebê no colo. Com o sonho ainda adiado. E tendo que administrar essa frustração, todos os dias desde então, além de muitas outras situações desafiadoras que a busca da maternidade tem me apresentado.
No meu segundo texto, "o luto não é linear" (leia aqui), lançado dia 31/05/23, eu comentei o seguinte:
Na semana passada, eu também tive que lidar com uma situação bastante desafiadora: descobri que duas pessoas muito próximas estão grávidas. E o sentimento envolvido é muito ambíguo: eu fico feliz por elas, do fundo do coração. Sei que vou amar muito esses bebês que estão vindo e que eles farão parte da minha vida e isso é ótimo, mas eu também fico com inveja. Isso mesmo, inveja. Esse sentimento considerado tão feio por muitos, mas que é tão humano. É inegável que eu também queria estar grávida, e ter uma gravidez saudável, como estão sendo as delas. Mas o meu momento por algum motivo não chegou.
Esses amados bebês nasceram, gente! Meu sobrinho Miguel, dia 03/01, e meu afilhado Fernando, dia 04/01, ambos cheios de saúde e trazendo muito amor para mim, suas mamães e famílias. Na época desse texto, eu tinha um receio de não conseguir curtir a chegada deles. E fiquei muito feliz que isso não se concretizou! Eu acompanhei de perto os dois nascimentos, um aqui em Porto Alegre e outro à distância, junto com a minha minha irmã e a minha amiga. E fiquei emocionada especialmente por esses lindos menininhos terem chegado bem e com saúde.





8 meses depois de eu escrever o parágrafo lá de cima, eu estou muito mais em paz. Fiquei genuinamente feliz com esses nascimentos e achei um bom sinal. Afinal, um ano que começa com dois nascimentos na sua primeira semana tem tudo pra ser lindo, né? Ainda assim, é inevitável não lembrar também dos meus bebês, que poderiam estar por aqui, crescendo junto com esses dois anjinhos, sendo amiguinhos. Então não me sinto 100%. Nem curada. Mas será que seria possível estar? Acho que não. E estou aceitando isso, aceitando mais esse fato que é diferente do que eu gostaria. Aceitando que preciso esperar.
Eu que sempre fui uma pessoa imediatista e controladora, com pouca paciência, estou tendo que aprender a lidar com as esperas da vida. Com as mudanças de planos. Com o tempo que não caminha exatamente como eu espero. Com o caminho que não é tão suave como eu gostaria. Ou que desviou da rota que eu queria caminhar.
Às vezes a gente tem a sensação de estar no caminho errado e se sente perdido entre o passado, o presente, e o futuro. Esquece que o caminho para um futuro ideal é uma sucessão de presentes ideais.
O caminho para um futuro ideal é uma sucessão de presentes ideais.
Muitas vezes nós resistimos à realidade que vivemos, seja ela relacionada a família, filhos, trabalho, saúde, finanças ou o que for. Lutamos querendo que seja diferente. E aí a gente se estressa quando não é. Porque a gente esquece que as coisas são como elas são, a gente só sofre porque gostaria que elas fossem diferentes.
E eu sofri muito por isso ano passado. Eu não estive bem na maior parte de 2023. Mesmo que "estar bem" seja algo tão amplo e pouco tangível, acho que a gente sabe o que significa pra cada um de nós, né? Eu tentei muito estar bem, mas na maior parte das vezes não consegui.
Acho que estar bem para mim significava chegar a dezembro com mais paz e menos medo. Menos presa ao que me aconteceu, mais esperando com otimismo o que virá. Tiveram dias que acho que consegui, e tiveram dias que me encontrei em um buraco achando que estava até pior. A não linearidade das coisas e do tempo esteve constantemente me desafiando. E o medo infelizmente esteve mais presente do que eu gostaria.
Só que o medo é algo que está totalmente ligado ao tempo. E ao controle.
Se existe qualquer coisa que você teme na sua vida hoje, você está viajando no tempo. Ou você está se conectando com algum trauma que aconteceu e que na sua cabeça poderia acontecer de novo ou você está viajando para o futuro e achando que algo ruim pode acontecer. No último, o medo é baseado em um evento que ainda nem aconteceu – e que talvez nunca aconteça. O fato é que o medo, todo tipo de medo, só existe quando a gente se desconecta do momento presente.
No meu caso, eu sofro com medo que no futuro o passado se repita. Que eu venha a ter mais uma perda. Mas ao mesmo tempo eu também tenho muita esperança de que o arco íris venha. Que o momento em que toda essa dor fique pra trás chegue. Só que seja no cenário de uma nova tempestade ou de um céu azul, eu fico seguidamente vivendo nesse futuro hipotético. E esqueço do hoje.
Por que às vezes é tão difícil a gente estar no agora? Por que a gente é tão ansioso? Por que a pressa para a linha de chegada? Qual linha de chegada? Honestamente, a linha de chegada de todos nós é a morte. E acho que a maioria de nós não quer se apressar pra chegar nela.
Eu entendi que não adianta eu apressar as coisas ou querer chegar logo ao meu céu azul. Percebi que a pressa não só é inimiga da elaboração, como falei no texto 15, mas ela também exclui a trajetória. E que a trajetória importa, ainda mais para mim. Se ela não importasse, meus dois bebês não teriam tido um propósito, e eu sinto no fundo do coração que eles tiveram um grande, que é me transformar. Só que isso não acontece tão rápido.
A pressa exclui a trajetória
Meu exercício atual é aceitar o momento presente, mesmo quando ele está sendo tão diferente do que eu gostaria. E não ficar presa no passado ou com medo do futuro. O que eu tenho aprendido é que, por mais que eu queira, eu não posso controlar o que acontece comigo. Mas eu posso sim me transformar a partir disso.
Você sabia que, a cada sete anos, todas as células do nosso corpo são substituídas por novas células e, do ponto de vista puramente físico, somos uma pessoa totalmente nova? Se fala muito também dos setênios - esse ano eu faço 35 anos, estou encerrando um setênio importante da minha trajetória. Chegando nos "30 e tantos" e saindo dos "30 e poucos". Eu comecei a mudar muito já nos 33, quando começou a minha revolução sobre maternidade e trabalho. Chegando nos 35, em abril, eu espero já ter elaborado ainda melhor tudo que aconteceu nesses últimos 7 anos e pensar em todas as mudanças que eu quero fazer para os próximos 7, até os 42. E ser uma pessoa nova, de fato. Não só agora em janeiro. Mas uma pessoa que a cada dia busca se tornar melhor. Pelos bebês que já vieram, pelos que virão, pela minha família e, principalmente, por mim mesma.
Eu honro o papel dos meus dois bebês na minha vida, e quero poder seguir com eles no meu coração, presentes. Presentes de uma maneira amorosa, feliz por eles terem me escolhido e me transformado. Deixando no passado os "e se" e todas as projeções que eu fiz com essas gestações.
Quero ser uma pessoa que criou uma nova realidade, um novo tempo, e que não ficou presa aos traumas do ontem. Eu entendi que a gente não pode viver o hoje baseado nas nossas crenças de ontem. E eu não sou mais a pessoa que fui.
Na verdade, percebi que eu estou já gestando dentro de mim uma nova pessoa. Mas não um bebê. Eu mesma.
Eu já sou uma pessoa diferente. Mais centrada. Mais ciente dos meus desejos e vontades. Mas que quer ser ainda mais diferente. E que quer ser feliz no presente, com as condições que tenho hoje, e não em um futuro hipotético.
Minhas crises de ansiedade de dezembro vieram para que eu finalmente entendesse o quanto eu precisava focar no hoje. Não o ontem e seus traumas, não o amanhã e seus medos. O hoje.
E, com isso, viver mais o agora.
Também entendi que a rigidez e o controle são uma faceta do medo. Você tenta controlar o que causa medo. Só que isso é impossível. Mas sabe o que é possível? Transformar o medo em fé. Uma amiga querida me disse isso ano passado e fez muito sentido: o medo é a ansiedade em relação a um cenário ruim hipotético. A fé é a esperança de um cenário bom hipotético. São duas faces da mesma moeda.
Não é trivial, mas vou cada vez mais escolher ter fé. Acreditar que não só porque o passado recente foi difícil, o futuro também será. Acreditar que tudo está como deveria estar. E que o melhor me aguarda. O pico e o vale fazem parte da mesma onda, são nuances da mesma vida. Meu pico vai chegar. Mas pra isso eu preciso confiar. E entregar.
O meu sonho de ter um bebê saudável é claro e está posto.
Quando eu perdi o primeiro bebê, queria logo engravidar do 2o para ver se a dor diminuía. Engravidei em um intervalo de 4 meses e perdi de novo. A dor aumentou. Aí tive que ficar quase um ano cuidando de mim, investigando as causas disso tudo, passando inclusive por cirurgias para preparar melhor meu corpo para uma 3a gestação. Uma cirurgia que me exigiu mais 4 meses de recuperação. Em breve começa um novo capítulo, de novas tentativas. E de novo, não sei quando essa terceira gestação vai chegar ou quando meu bebê saudável estará por aqui. Eu sonho muito com esse momento. Sei que ele vai chegar. Só que eu cansei de tentar controlar essa hora. Percebi que, de qualquer forma, isso não faz diferença.
Por isso tudo, minha grande meta de 2024 não é SMART (Específico, Mensurável, Alcançável, Relevante e Temporal, traduzido do inglês) e da forma que o mercado exige e que eu sou acostumada. É uma meta simples, muito difícil de ser alcançada para mim, mas muito necessária também:
Focar no hoje construindo uma sucessão de presentes ideais. Sair do modo controle e entrar no modo entrega.
Nas últimas semanas, já tentando entrar cada vez mais nesse mindset, eu consegui, finalmente, trazer com mais consistência a meditação para a minha vida. Em 2023 eu comecei a meditar, mas meditava em momentos de medo, ansiedade ou angústia. Não esperei fazer uma resolução ou virar o ano e decidi que eu teria mais consistência na meditação. E com isso comecei a meditar todos os dias.
Eu já sabia que precisava fazer isso, mas não priorizava fazer. O empurrão final veio ao ler o livro 10% mais feliz - um livro que conta a história de um apresentador de TV norte-americano que era extremamente estressado e controlador e que começou a sofrer com ataques de pânico (qualquer semelhança não é mera coincidência rsrs). E ele conseguiu lidar com elas mergulhando no mundo na meditação, que, de quebra, fez com que ele ficasse, segundo ele mesmo, cerca de 10% mais feliz. A leitura do livro é super interessante por aliar uma história pessoal com técnicas de meditação e eu gostei muito. Recomendo pra quem, assim como eu, também estiver precisando daquele empurrãozinho final para trazer a técnica para sua vida de vez. Veja o link aqui.

Outra coisa que eu fiz nessa lógica de controlar menos é dar férias para o meu Apple Watch. Desde a última crise de ansiedade, eu percebi o quanto ele estava piorando as coisas. Eu começava a me sentir mal e ficava obcecada por controlar os batimentos no relógio. Ao ver eles aumentando, acabava ficando ainda mais nervosa. Além disso, o Apple Watch era uma forma de eu controlar cada passo que dava e metrificar a minha vida. Percebi que isso estava pouco saudável de maneira geral e resolvi parar de usar, pelo menos por um tempo.
Eu tenho Apple Watch desde 2016 e do seu lançamento e era super adepta, então desapegar dele é uma grande mudança de paradigma para mim. E para simbolizar essa mudança, meu marido e grande apoiador, me deu de presente de Natal um lindo relógio analógico. Daqueles que só nos dizem as horas mesmo, sabe? Rsrsrs. Eu amei o presente. Olho para o meu pulso e já me sinto mais tranquila e mais feliz. Parece que, analogicamente e com menos controle, o tempo passa mais devagar, de alguma forma. Talvez ele seja mesmo, relativo.
Desejo para mim e para todos nós um 2024 de menos controle, e de mais entrega. Um 2024 em que o presente predomine. E em que, talvez, a gente seja o nosso próprio presente.
Muito muito obrigada por estarem aqui comigo. Para todos que já leram algum texto. Para todos que deram um like, comentaram ou compartilharam. Para todos que torcem por mim e pela minha família - eu sei o quanto meus dois bebês foram amados e quanto os próximos já são, e toda vez que penso isso fico com lágrimas nos olhos.
E um muito obrigada especial a quem esteve desde o início, dia 12/05/2023, e que ao que me parece não perde um texto. Tenho grandes apoiadores da minha descoberta como escritora. São familiares, amigos próximos e virtuais, muita gente boa que não solta a minha mão e que toda a hora me pergunta quando sai o meu livro (será que esse ano?). Espero um dia poder retribuir todo o incentivo e amor que vocês me trazem. Muito obrigada de coração.
Para esse ano, eu reforço mais uma vez o pedido de sempre: se você gosta dos meus textos, por favor me ajude dando um like no Substack, deixando um comentário ou compartilhando com alguém que pode gostar desse conteúdo? Apesar de eu não ter estabelecido grandes metas, crescer nessa plataforma é um dos meus grandes objetivos do ano, bem como me estabelecer como escritora. Sigo contando muito com a ajuda e com os feedbacks de vocês nesse processo.
Leia os textos anteriores
#15. A pressa é inimiga da elaboração
Era uma sexta de manhã de novembro. Eu tinha recém acabado uma reunião de trabalho, da consultoria que estou prestando. Uma reunião tranquila, nada de tensões ou conflitos. Depois dela, eu tinha a tarde cheia de compromissos e coisas para resolver na rua.
#14. Sobre vulnerabilidade, ipês roxos, ligamentos e redes sociais
Eu sempre fui extrovertida, comunicativa e sem muitas vergonhas, no geral - quem me conhece sabe. Mas eu também sempre gostei de me mostrar forte e, como muitas pessoas, muitas vezes colocava uma máscara pra esconder aquelas partes ruins da vida ou de mim mesma. Não gostava de expor minhas falhas ou fraquezas, apesar de saber muito bem que elas existiam…
Ao ler os teus textos tb tenho ótimos momentos de reflexão. Que 2024 seja um ano de presente ❤️
Que texto lindo, Paola! Obrigada por nos trazer tanta verdade 🤍 que 2024 seja de fato um ano de colheita, de realizações e entrega!