#39: Uma sucessão de presentes ideais
Um bebê só conhece o momento presente. Aquele presente extremo.
Esses dias lembrei muito vividamente de uma cena: eu com uns 10/11 anos, um dia de manhã na sala de casa, vendo TV, muito angustiada. Estava triste e chateada por um motivo simples: meus pais estavam ficando velhos. Eles nasceram no mesmo ano, 1962. Eu, em 1989.
No momento daquela cena, segundo os registros da minha mente, eles iam fazer 38 anos. E eu pensei que eles estavam chegando próximo aos 40. Que logo seriam idosos. Que iam morrer! Acho que pela primeira vez contemplei essa possibilidade e senti essa angústia, que, de uma forma ou de outra, me acompanha até hoje.
Vejam bem, eles iam fazer 40 anos! Na minha cabeça de uma pré-adolescente, muito apegada aos pais, eles estavam ficando velhos de verdade. E eu não queria que isso acontecesse.
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Nesses últimos dias, passei por dois marcos importantes: minha filha, Felipa, fez 6 meses. E eu, fiz 36 anos.
Nessa mesma época do ano passado, que parece que foi tipo anteontem, eu fiz 35 e ela chegou às 12 semanas dentro de mim, uma etapa do primeiro trimestre que nunca tínhamos alcançado nas gestações anteriores.
Seguimos entrelaçadas nos marcos e nas significâncias da vida. Claro que, naturalmente, por sermos mãe e filha, acho que sempre estaríamos e sempre estaremos. Mas essa questão das idades e dos tempos tem me pegado cada vez mais.
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Me aproximo rapidamente da idade que meus pais tinham naquela cena.
Eu sempre senti que o tempo voava. Ou quase sempre.
Nos dois anos em que busquei, com todas as forças que tinha, pela maternidade, entre a primeira gestação e a chegada da Pipa, talvez o tempo tenha, de fato, passado mais devagar pra mim. Mais arrastado, pelo menos. Aquelas esperas para o fim do primeiro trimestre nas duas primeiras gestações, que nunca chegaram. Os 30 dias que tive que esperar para expelir os bebês nas duas perdas, as semanas mais arrastadas da história da minha vida. Os 4 meses que tive que esperar pra voltar a tentar engravidar depois da cirurgia de retirada do mioma. A espera infinita pelas 12 semanas na terceira gestação, dessa vez finalizada com sucesso.
Essas esperas foram, definitivamente, muito longas, e trabalharam demais minha paciência e resiliência.
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Só que, desde que a Felipa nasceu, o tempo voltou ao seu padrão normal para mim. Voltou a voar.
E voar ainda mais rápido, na verdade. Ainda mais alto, talvez.
Agora, com uma bebê, o tempo parece que se tornou ainda mais líquido.
Já tive que fazer duas grandes “faxinas” no armário dela, separando sacolas de roupas que já não servem.
Já nos despedimos do sling (meu maior aliado nos primeiros 2 meses), do ninho no berço e do uso do bebê conforto no carrinho.
Há 1 semana tivemos a despedida mais difícil para essa mamãe aqui. A despedida da amamentação exclusiva.
Após um começo muito difícil, eu e a Pipa entramos em um ritmo bom de mamadas a cada 3h e em que o momento era prazeroso para nós duas.
Nós nos bastamos nesses 6 meses. Agora, não mais.
Há 1 semana estamos abrindo espaço para as bananinhas, os feijões, as lentilhas, os moranguinhos…
Está sendo lindo de ver.
Receber nota 10 na pedi, ver seu bebê lindo e saudável, crescendo como deveria crescer, acho que é o maior prazer e o maior presente pra uma mãe. Mas, ao mesmo tempo, as calças curtas e os bodys que já não fecham nos lembram de tudo que não volta mais.
Ah, esse tempo que insiste em voar. Esses bebês que insistem em crescer! As contradições que insistem em aparecer na maternidade!
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E quem percebe isso, por enquanto, sou só eu, e não ela.
Um bebê só conhece o momento presente. Aquele presente extremo.
Aquela mamada.
Aquela frutinha.
Aquele banho.
Aquela leiturinha.
Aquela soneca.
Aquele passeio.
Aquilo é tudo que eles tem.
Para um bebê, nada mais importa do que aquela única coisa do momento. Nada mais que o agora.
É sempre uma coisa de cada vez, com atenção plena a aquela coisa.
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As primeiras civilizações não sabiam medir o tempo. Só conheciam o presente. Aprenderam ao prestar atenção. Ao observar o sol. A lua. As estações do ano.
Hoje, a gente busca ser feliz em meio a uma revolução tecnológica. Acho que o tempo, inclusive, está mais precioso pois a tecnologia está cada vez mais rápida. Parece que a gente nunca alcança, que a gente nunca chega.
Talvez o caminho seja viver um instante de cada vez, mesmo que o mundo continue acelerando.
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Com 6 meses da minha bebê, estou começando a me sentir mais ansiosa novamente. Seguidamente me desprendendo do agora e pensando muito no futuro, no que preciso fazer, realizar, tirar do papel, na to do list infinita. A carga mental da mãe está pegando, mesmo tendo um marido e pai com quem dividi-la.
Preciso me lembrar mais de desfrutar cada momento. Preciso me lembrar que o passado já passou. Que o futuro ainda não existe. Que na prática, isso faz com que tenhamos, de fato, apenas o agora.
Esse agora é o presente. E quantos presentes eu recebo quando consigo aproveitar o presente com a minha filha?
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Acho que o futuro ideal se constrói a partir de uma sucessão de presentes ideais. E, agora, o presente ideal pra mim é aquele em que eu consigo, pelo menos um pouquinho, ver, literalmente, a minha filha crescer. Em que registro, no meu consciente, subconsciente e inconsciente, todos os momentos ordinários e extraordinários com ela. Aqueles micro instantes: um carinho com a sua mãozinha no meu colo enquanto ela mama, o olhar atento para as árvores em um passeio de carrinho, aquela pegada na colheirinha levando à boca uma frutinha, a água caindo na cabecinha durante o banho e o fechar rápido de olhos com o sustinho que ela leva toda vez que isso acontece, aquela última mirada nela no bercinho antes de desligar a luz pra dormir…
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Felipa me lembra que eu preciso aprender a lidar melhor com o tempo, uma questão que me acompanha desde a infância. Preciso explicar para aquela Paolinha que ela não precisa se angustiar tanto. Que temos tempo. Mas de fato, pouco controle. O que controlamos, minimamente, apenas, é o agora.
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Nessas últimas semanas, passamos por um pequeno susto com a minha mãe. Um exame que levantou suspeitas e requereu uma biópsia. Minha mente voou pro futuro. Para os medos. Para as angústias. Para os mil cenários hipotéticos ruins que poderiam se suceder.
O resultado do exame estava previsto para o dia do meu aniversário, o que só potencializou a minha ansiedade. Eu pensava: será o aniversário mais feliz ou o mais triste da minha vida? E agora?
Graças a Deus, a biópsia voltou com resultado positivo (ou negativo, no caso, rsrs). Ficamos sabendo uns 5 minutos antes de cantar os parabéns. E por mais que os desejos de parabéns desse ano vieram, em sua grande maioria, acompanhados da frase de que eu tinha o meu maior presente no colo, eu não podia evitar de pensar que sim, meu maior presente era meu bebê no meu colo, mas também meu coração tranquilo de que a minha mãe estava bem.
Não era "nada”.
Acho que era só um chacoalhão pra que a gente aproveite ainda mais o agora. E pra preparar o futuro a partir de uma sucessão de presentes.
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Com 36 anos, tenho uma bebê de 6 meses e uma mãe ainda jovem, no início dos sessenta anos.
Quero principalmente saúde. Para nós três.
Mas quero aprender a lidar melhor com o tempo, para que eu possa viver cada vez mais inteira de presente e menos fragmentada de passado ou de futuro.
Que eu possa, nesses 36, aprender mais sobre calma, sobre atenção, sobre entrega, sobre presente.
Que eu possa construir a minha sucessão de presentes ideais. Junto com ela, meu maior presente, no colo - ou no cadeirão comendo uma frutinha! E com a minha mãe por perto, sempre que possível.
Que assim seja <3
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Esse texto talvez tenha ficado um pouco mais confuso.. Talvez eu esteja confusa e tentei traduzir em palavras essa confusão.. Fato é que essas variações de tempo não andam fáceis por aqui. E você, como lida com o tempo e com a sua passagem? Alguma dica pra que a gente possa cada vez mais, desacelerar o tempo que fica cada vez mais precioso?
Pra escrever esse texto, eu consultei o meu próprio repertório e reli alguns textos meus em que falei do tempo, especialmente aqueles de antes da chegada da Felipa. Se quiser me acompanhar lendo as reflexões da Paola de cerca de 1 ano e meio atrás, segue:
Sobre minhas crises de pânico, no final de 2023:
No comecinho da gravidez, ainda não revelada publicamente, mas muito ocupada do tempo:
6 meses grávida, às vezes querendo que o tempo fosse mais devagar, às vezes querendo que ele voasse:
Repertório PZB
O que eu venho lendo, assistindo, escutando:
Terminei de ver Adolescência na netflix. Quero ver mais uma vez. É muito potente. Apenas vejam, caso não tenham visto ainda. Especialmente se você for pai ou mãe.
Pra quem lê em inglês e tá no mundo de tecnologia e grandes empresas, sugiro muito esse texto aqui da Elena Verna do Growth Scoop. Me identifiquei com as ideias e com a provocação pra que você tenha um sempre um plano B - algo que eu nunca tive no mercado corporativo.
Mais uma ótima edição da Desejante. Pra gente se assumir como adulto de uma vez por todas.
Sou fã do podcast Gostosas também choram, da Lela Brandão. E o episódio “as pessoas querem que você emagreça", tá incrível, discutindo a volta do culto à magreza depois de alguns anos mais gentis em que se via o body positive mais frequentemente no mainstream. Vale escutar e refletir!
Estou terminando de ler o livro Ioga, do Emannuel Carrere. Impactada. O autor vem da leva de autores franceses que trabalham com autobiografia, como Annie Ernaux e Edouard Louis. Nesse, ele mistura ioga, depressão, crises humanitárias e ataques terroristas e provoca grandes reflexões em uma prosa que simplesmente flui.
Se quiser me acompanhar com mais frequência e ver fotos de uma bebê muito fofa, fique super à vontade pra seguir também no Instagram no @paolazbehs.
Se quiser conhecer minhas mentorias de liderança e de marketing, acesse meu perfil na e-mentor ou me mande uma mensagem. A agenda está aberta!
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Te leio com a minha pequena, que em dois dias faz nove meses fora da barriga, nos braços, de banho tomado e caindo no sono enquanto mama, e enquanto trocávamos a fralda dela meu marido falou que precisamos tirar mais fotos porque ela tá crescendo muito rápido. Passa rápido né? Esse presente tão cheio de intensidade e transformações. Que bom que sua mãe está bem e que vocês três estão aí cheias de saúde e motivos para celebrar. Feliz Aniversário ❤️